Um consórcio internacional coordenado pelo investigador do CIIMAR Agostinho Antunes propõe uma plataforma do tipo “Web of Venom” para dar resposta ao volume imenso de dados e interdisciplinaridade na área dos venenos e toxinas.
Um consórcio internacional coordenado pelo investigador do CIIMAR Agostinho Antunes, reuniu e consolidou todas as necessidades de centralização da investigação mundial feita sobre os venenos e toxinas e propõe uma plataforma do tipo “Web of Venom” para dar resposta ao volume imenso de dados e interdisciplinaridade na área. O objetivo é facilitar o trabalho dos investigadores e agilizar a investigação futura em larga escala.
Como consequência de um brainstorming tão intenso no seio dos principais investigadores na área dos venenos animais, foi lançada a ideia de compor, selecionar e explorar uma base de dados unificada específica de venenos que reportasse venenos e toxinas de diversas espécies animais, incluindo a arquitetura e função do genoma, os alvos das toxinas, o mecanismo de ação assim como dados ecológicos e evolutivos. Esta “Web of Venom” – seria alimentada pela colaboração e esforços concertados por parte dos investigadores, médicos e organizações na investigação sobre venenos e as suas aplicações.
Os venenos de origem animal têm intrigado a curiosidade humana ao longo dos séculos e, recentemente, os avanços tecnológicos em diversas áreas de investigação, especialmente na biologia molecular, têm gerado um interesse crescente na comunidade científica. O que têm de especial estes organismos venenosos para despertar este interesse? Possuem uma habilidade impressionante de produzir e libertar potentes coquetéis de compostos bioativos, conhecidos como venenos, que podem induzir efeitos fisiológicos significativos em outras espécies. Essas misturas complexas de proteínas, peptídeos, pequenas moléculas orgânicas e elementos inorgânicos foram moldadas ao longo de milhões de anos de evolução, principalmente devido à pressão seletiva, como a predação e a defesa.
O surgimento e integração de tecnologias multiómicas, como a proteómica, a transcriptómica e, mais recentemente, os dados do genoma completo, revolucionaram a caracterização dos componentes dos venenos e destacaram o seu potencial biotecnológico. Esse foco atraiu a atenção da indústria, que reconhece o potencial das toxinas animais como candidatos a novos medicamentos, a ferramentas de diagnóstico, a biopesticidas, a agentes antimicrobianos e antiparasitários, além de marcadores biológicos para o estudo da fisiologia humana.
A utilização destes dados cada vez mais volumosos na investigação sobre venenos animais e seus componentes abrange várias disciplinas, como a biologia, a bioquímica, a bioinformática, a farmacologia, a medicina, entre muitas outras. Para isso, é obrigatória a manipulação e análise de uma imensidão de dados dispersos por diferentes plataformas, o que dificulta acesso para aqueles que não são especialistas na área. Ao mesmo tempo, o crescimento da quantidade de dados disponíveis aumenta exponencialmente as possibilidades de investigação, tornando ainda mais pertinente a sua centralização.
Segundo o investigador do CIIMAR Agostinho Antunes, “à medida que os dados de veneno se acumulam, o desafio evolui para descobertas comparativas mais sofisticadas de integração de dados multiómicos com recurso à inteligência artificial, facilitando uma compreensão abrangente da complexidade dos sistemas biológicos e dos seus mecanismos subjacentes.” Mas, para isso, é necessária uma centralização, organização, uniformização, destes dados.
A urgência da centralização de dados biológicos
Enfrentar um desafio desta envergadura requer recursos centralizados e coordenados baseados na Web que possam servir como repositórios de dados e conhecimento, facilitando a utilização contínua de ferramentas analíticas, pipelines de bioinformática e bases de dados relacionadas, impulsionando, em última análise, a investigação de ponta sobre os venenos.
No artigo “Web of venom: exploration of big data resources in animal toxin research”, investigadores de todo o mundo abordaram as necessidades multifacetadas da comunidade científica envolvida na investigação relacionada com venenos e toxinas, identificando e discutindo recursos da web, bases de dados e ferramentas habitualmente utilizadas e destacando os desafios que enfrentam diariamente no acesso e utilização destes recursos. Neste trabalho, os investigadores destacam a importância de melhorar as normas, promover a interoperabilidade e incentivar a partilha de dados e métodos dentro da comunidade de investigação sobre venenos. Destaca-se a necessidade de garantir a acessibilidade e a normalização destes dados sobretudo no que diz respeito à sua disponibilização para as comunidades clínicas que possam usufruir deste conhecimento para tratar doentes diariamente.
Uma plataforma integradora
Agostinho Antunes demonstra as vantagens de uma plataforma acessível: “ao consolidar informações tão diversas num único recurso ou interface unindo uma série de recursos, os cientistas que trabalham no campo interdisciplinar dos venenos e toxinas animais teriam uma ferramenta valiosa à sua disposição. Permitir-lhes-ia aceder a informação geral e específica sobre um vasto número de espécies venenosas e toxinas e diminuiria o tempo despendido em extensas pesquisas bibliográficas.” Este recurso poderá, também, contribuir significativamente para a investigação sobre venenos, facilitando a classificação das proteínas do veneno, auxiliando no desenho de péptidos com propriedades farmacológicas desejadas e identificando potenciais interações.
Neste sentido, no contexto do artigo publicado na revista GigaScience, os investigadores compilaram também uma tabela interativa disponibilizada no site VenomZone, do SIB Swiss Institute of Bioinformatics, que consideram um bom ponto de partida para o lançamento de uma grande plataforma de dados sobre a investigação em venenos e toxinas animais que alcançaria ferramentas de todo o tipo, incluindo a inteligência artificial e a computação de procedimentos.
“A padronização de dados, os métodos computacionais avançados, como a inteligência artificial, e a interpretação de diversos tipos de dados são fundamentais para fornecer avanços significativos. O progresso no sentido de satisfazer as necessidades da comunidade de investigação sobre venenos requer o estabelecimento de um recurso computacional dedicado específico aos venenos que esperamos ajudar a contribuir muito em breve”, remata Agostinho Antunes.
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